Balas perdidas no Rio de
Janeiro, bombardeios na Síria, abuso infantil... as pessoas estão perdendo sua
humanidade. A honestidade e o respeito escorrem pelo ralo ao ler ou assistir
qualquer jornal, onde a violência tem lugar de destaque e já não choca mais
quase ninguém. Deixamos a inocência da Chapeuzinho Vermelho de lado e nos
tornamos o Lobo Mau: enganamos os outros e devoramos a empatia.
Thomas Hobbes tornou
célebre a frase “O homem é o lobo do homem”, do
dramaturgo romano Platus, ao reafirmar que “o homem é o maior inimigo do próprio homem”.
Em vez de humanidade, o homem aproxima-se da selvageria animal ao agir com desrespeito
e violência cometendo atrocidades contra a própria espécie. Aparentemente não
há mais pudor em matar, abusar, torturar, roubar...
Há três anos, a foto do
menino Aylan desfalecido na praia estampava as manchetes de jornais e revistas.
Ainda hoje, muitas crianças sírias continuam sendo alvo dos bombardeios e das
metralhadoras apontadas diretamente para suas famílias. As “balas perdidas”
(que têm endereço e sobrenome) continuam a destruir comunidades e esperanças,
sem previsão de trégua. Não é só uma fase, a intolerância e a guerra são contínuas
(porque queremos).
O ser humano tem uma
habilidade enorme para adaptar-se. O que, a princípio, é uma qualidade, também
se torna sinônimo de fraqueza ao ver que, sem perceber, nos acomodamos com o
que nos incomoda. Mais uma pessoa pedindo ajuda no semáforo, mais um que não
foi socorrido a tempo no pronto-socorro, mais um jovem encarcerado, mais uma
vítima de bullying que atirou contra os colegas de sala...
O lobo mau não é
essencialmente mau, mas vai deixando esse lado ruim aflorar ao se deparar
continuamente com um ambiente hostil, apático e aversivo. Nos adaptamos aos
dias ruins, às filas de espera, à corrupção e, por fim, à maldade. O mundo não
vai bem há tempos, mas não tenho tempo para pensar, ou sequer tentar mudar a
situação, afinal, o lobo mau são os outros. A gente se acostuma, mas não deveria.