A criança que adora
correr e brincar é hiperativa. A pessoa que só pensa em dormir é depressiva. Já
não há mais um meio termo. Se pararmos para analisar as descrições atuais de
transtornos mentais descritos em manuais como DSM-V e CID-10, constataremos que
todos somos doentes em algum grau.
Machado de Assis em
1882 já abordava essa questão em “O Alienista”. Ele conta a história de um
médico que decide estudar a psiquiatria e funda a Casa Verde, um hospital
psiquiátrico, onde ele internava qualquer pessoa que apresentasse um
comportamento fora do comum. Com o tempo, o simples fato de a pessoa ser muito
indecisa ou extremamente bajuladora era sinônimo de loucura. Ao longo da
narrativa, o psiquiatra perde a noção entre normal e anormal, razão e loucura
quando percebe que praticamente todos os habitantes da cidade estão internados.
“O Alienista” nos fala
da patologização de comportamentos e personalidades. Cada um tem uma
personalidade e um modo de se comportar baseados em fatores epigenéticos
(influenciados tanto pela genética quanto pelo ambiente em que vive). Portanto,
seu modo de ser não caracteriza necessariamente um transtorno mental. Aqui se
faz necessário entender que apesar de podermos apresentar sintomas de alguns
transtornos psiquiátricos, isso não significa que somos necessariamente
doentes.
Algumas crianças são
mais ativas que as outras, assim como algumas pessoas têm manias de
organização, mas não significa que esses sujeitos sejam loucos. As estatísticas
crescentes de transtornos mentais podem ter duas razões principais: o aumento
de conhecimento por meio de estudos e a informação ao alcance de todos. O
avanço das pesquisas auxilia no diagnóstico precoce de uma condição de saúde.
Por outro lado, a informação a um clique de distância leva à banalização de
diagnósticos. O normal da criança é brincar. Aquela que não brinca é autista,
enquanto aquela que não sossega é hiperativa. Há diagnóstico para todos.
É preciso ter cuidado e
avaliar se o comportamento da pessoa é realmente uma característica dela,
portanto, constante, ou se é apenas reflexo da fase de desenvolvimento ou
estimulação ambiental. É preciso uma avaliação profissional para diagnosticar
tais transtornos, que são analisados com base na quantidade de sintomas e na
qualidade de vida da pessoa, lembrando que cada caso é um caso.