sábado, 27 de fevereiro de 2016

O medo da escolha


Ser adulto envolve fazer escolhas, e isso é assustadoramente difícil. Optar por um caminho é consequentemente deixar outro para trás e enquanto não se escolhe, vive-se com a possibilidade. Mas a vida exige escolhas, e a pressão social pode lhe fazer escolher o caminho mais “prudente”, não necessariamente o mais feliz.
Com o passar do tempo (que por sinal parece passar mais rapidamente conforme envelhecemos), sentimos a necessidade, senão desespero, em fazer as escolhas certas. Refletimos se estamos onde imaginávamos em nossos sonhos ou se continuamos naquele emprego temporário ainda esperando pela oportunidade de finalmente fazer o que queremos. Mais um dia de trabalho sem motivação e novamente o sonho é adiado pelo medo de arriscar...
Chega um momento em que o que era para ser temporário torna-se cômodo e já serve para pagar as contas e sair de férias, então, pra que arriscar? Pouco a pouco, o indivíduo vai perdendo a vontade de recomeçar e perde a coragem de dizer não ao comodismo. Largar o emprego é loucura. É preferível uma monotonia certa a um prazer incerto. E mais um dia nos arrastamos até o trabalho, contando os dias para sexta-feira e invejando os que amam o que fazem.
Milan Kundera em “A insustentável leveza do ser” sugere que há uma certa leveza em se fazer o que não gosta. Fazer aquilo que nos dá prazer é um fardo muito pesado, pois nos cobramos demais. No entanto, apesar do peso, a satisfação pelo resultado do trabalho obtido é extremamente gratificante e o fardo torna-se leve ao seguir o caminho que se quis, não aquele que foi obrigado.

Existe uma diferença entre viver e sobreviver. Trabalhar somente por obrigação é sinônimo de sobrevivência e leva a problemas de saúde a longo prazo, como depressão, transtorno de ansiedade e distúrbios psicossomáticos. É nesse momento que o sonho grita do fundo da alma e exige uma escolha. O “não” à sobrevivência é o “sim” à vida. Ter a coragem de sair de um ambiente onde você não se sente bem é conquistar a liberdade para seguir outro caminho que você talvez tenha planejado durante tantos anos.

sábado, 13 de fevereiro de 2016

Felicidade 10mg



Vinícius de Moraes e Tom Jobim já diziam: “Tristeza não tem fim, felicidade sim.” Mas não há problema, a indústria farmacêutica já vem cuidando dessa questão, revolucionando a vida dos tristonhos e desanimados com Rivotril, Prozac, Ritalina... Ah, a tão almejada felicidade agora vem em pequenas doses em forma de comprimidos!
Existe uma geração mimada e imediatista. Quer tudo pra ontem, quer tudo da maneira que deseja, quer evitar o sofrimento a qualquer preço.  Ela foi criada por uma sociedade que supervaloriza o sucesso, a revolução tecnológica e a felicidade estampada nas redes sociais. Ela é artificialmente feliz. Acontece que essa geração não aguentou... e finalmente adoeceu.
Para tratar de todas as enfermidades, geralmente psicossomáticas (que têm origem psicológica) dessa geração, são prescritos cada vez mais medicamentos para suportar mais um dia de trabalho sem motivação ao invés de se procurar a causa do problema. Não se aceita a dor. Aliás, falar sobre o sofrimento para um psicólogo é justamente afirmar que se tem uma tristeza; e isso é inadmissível na nossa sociedade feliz. O filme “Geração Prozac” ilustra bem essa geração.
O medicamento pretende melhorar a qualidade de vida das pessoas que estejam com algum grau de sofrimento, seja físico ou psíquico. No entanto, atualmente, percebe-se o uso indiscriminado dos remédios para manutenção da saúde, ainda que não sejam necessários. Ocorre a mecanização da vida e a automatização dos sentimentos. Para lidar com o luto pela perda de um ente querido, receita-se um antidepressivo pela urgência de voltar a ser feliz socialmente e laboralmente funcional.

Enquanto a indústria farmacêutica lucra com a venda da “felicidade em comprimidos”, a geração fica cada vez mais refém da Ritalina, do Rivotril... e vive cada dia à espera de uma nova droga para a solução da ansiedade perante uma escolha de vida. Estamos viciados na felicidade artificial e esperamos a cura para todo o mal que nós próprios criamos. Precisamos urgentemente de uma reabilitação para aprendermos a lidar novamente com nossos próprios pensamentos e sentimentos, de modo a conseguirmos contradizer os pais da Bossa Nova naturalmente.