sábado, 16 de dezembro de 2017

Seja feita a “minha” vontade


Esqueçam o famoso “na volta a gente compra”. As crianças fazem birra, xingam os pais e ainda ganham o desejado presente de natal, sem se importar se os demais membros da família conseguirão ganhar algo também. A ditadura do “eu quero, porque sim” toma cada vez mais espaço na sociedade de consumo e a publicidade não perde tempo em acolher seus mais fiéis clientes: as crianças.
No documentário “Criança, A Alma do Negócio”, de Estela Renner e Marcos Nisti, são apresentados diversos vídeos mostrando como as crianças são as maiores incentivadoras do consumismo dentro dos lares brasileiros. Elas assistem a uma variedade de comerciais induzindo à compra de brinquedos, roupas, sapatos e por aí vai. Elas podem não saber ler, mas já conseguem identificar o logo do McDonalds.
Os pais por sua vez, acabam cedendo às vontades dos pequenos; afinal, eles precisam trabalhar para garantir um futuro melhor para seus filhos e não têm tempo para brincar com eles. Sendo assim, começam a satisfazer seus desejos para vê-los felizes, sem saber que estão passando a falsa impressão de que sair às compras é sinônimo de alegria. Mas não se preocupem, a culpa não é somente de vocês, afinal, todos estamos inseridos numa sociedade capitalista...
A satisfação em encher o carrinho com compras é menos duradoura do que as diversas prestações do parcelamento dos bens de consumo adquiridos. Isso explica uma sociedade insatisfeita e “vazia” que sempre quer mais. O filme “Clube da Luta” de David Fincher ilustra esse tema com algumas colocações válidas: “Temos trabalhos que odiamos para comprar coisas que não precisamos.”

Assim, cada vez mais o Natal tem presentes e menos presença. Afinal, estamos todos procurando uma roupa bonita para passar o feriado sentado no sofá mexendo no celular. A mídia continuará impondo o consumo, o comportamento de compra, no entanto, é algo aprendido, e nada melhor como o exemplo dos pais dentro de casa. Retomar a tradição de conversar com os filhos é o maior presente, afinal, independente da religião, o espírito natalino fala é de amor.

sábado, 18 de novembro de 2017

Sobre os monstros em cada um de nós



Corrupção, sequestro, suicídio... violência gerando violência. “O mundo está ao contrário e ninguém reparou.” Aprendemos a justificar um erro com uma mentira e a resolver um problema apontando um culpado. Afinal, em um mundo caoticamente imoral, mais uma mentirinha nem vai fazer diferença. E assim damos continuidade ao ciclo de violência social, psicológica e física.

Ao longo da vida, acumulamos medos, incertezas e fracassos, os quais não podemos expor, afinal, falar sobre nossas inseguranças é sinal de fraqueza. Guardamos mágoas, raiva e traumas até não caber mais em nós. Então explodimos. Jogamos violentamente para fora o que não conseguimos mais conter e quem estiver por perto que desvie do “sabugo”. Embora seja difícil aceitar, somos frágeis e essa catarse periódica está aí para nos mostrar isso.
Acontece que cada um tem uma experiência de vida, portanto cada um tem uma maneira própria de expulsar esses traumas de si. Algumas pessoas são mais agressivas, outra um pouco mais contidas, alguns arremessam a fúria nos outros e outros implodem, acabando consigo mesmos. A verdade dolorida é que, no fundo, reconhecemos esses gestos de agressividade – em maior ou menor grau - também dentro de nós. E isso nos assusta.
Não sabemos do que somos capazes quando estamos com raiva. No momento de fúria, xingamos, batemos, brigamos e não nos reconhecemos. É como se estivéssemos “fora de si”. Depois da tormenta, a calmaria assusta. Podemos ver às claras nossos receios, agora menos fantasmagóricos e mais nítidos. Nosso medo tem cara, tem cheiro, tem memória. Nossa fragilidade se apresenta para nós e não sabemos como aceitá-la, afinal, fomos criados para sermos fortes.
Nessa dificuldade em aceitar nossos monstros, vamos culpando os políticos pela corrupção (sem pensar que nós os elegemos), inventamos uma dor de cabeça para não darmos andamento em uma discussão (que iniciamos) e mentimos para o chefe sobre uma morte na família para sermos dispensados do trabalho. Encarar a verdade é mais aterrorizante do que um filme de suspense.
Mas é preciso. É necessário compreender que se o mundo está do avesso, é porque também demos nossa contribuição para tal. Fosse fazendo algo ou deixando de fazer. Deixar de dar atenção a um filho o deixará triste. Ele expressará essa tristeza na escola, praticando bullying com um colega de sala. Essa colega se irritará e maltratará um cachorro, que morderá seu dono, que o sacrificará. Tudo é um ciclo. Aceitar seus monstros e respeitar os dos outros gera aceitação e uma possibilidade de reparar o mundo, tirando-o do lado avesso.

sábado, 14 de outubro de 2017

Crônicas de uma tragédia anunciada


O transtorno mental não tem fisionomia. A doença é silenciosa, mas presente, e cresce lentamente como uma flor na mente da pessoa, criando raízes obscuras e cinzas. O caso do vigia que ateou fogo na creche em Janaúba, o atirador em que matou pessoas durante um show em Las Vegas e outros tantos homicídios e suicídios não são apenas tragédias... são mortes anunciadas.
Uma doença psiquiátrica não se desenvolve em poucos dias. É necessário uma quantidade e uma duração de sinais e sintomas, além de considerável prejuízo na vida social, profissional e acadêmica da pessoa. O vigia já havia sido diagnosticado em 2014 com “transtorno delirante persecutório”. O atirador americano tinha 42 armas em casa. E o que foi feito? Deram atenção ou acharam frescura a pessoa pensar que estava sendo perseguida? Acharam algo normal colecionar tantas armas?
A doença está na mente, mas as causas estão também no ambiente. Onde estavam os entes queridos desses homens? Onde estava o suporte social que eles tanto precisavam? Quem se dispôs a ouvir seus problemas e angústias? Não é apenas uma sessão com o psicólogo que mudará a vida da pessoa. Não é uma consulta com o psiquiatra que resolverá o problema com um remédio. Assim como outras doenças, o transtorno mental é coisa séria e requer um tratamento adequado.
Ninguém fica triste, sem motivação ou solitário porque quer. São diversos acontecimentos que levam a pessoa a se sentir assim. Em um ano é a perda de um ente querido, um assalto, anos depois o desemprego, a separação... nada acontece e passa. A vida é a mesma e a história apenas continua. E a pessoa tem que absorver tudo isso, lidar com o dia a dia desgastante e seguir em frente (e de preferência sorrindo). Afinal todo mundo sofre não é mesmo? Então cada um com seus problemas.
O discurso é sempre o mesmo: “Fulano nunca deu sinais de que iria fazer isso. Parecia tão feliz esses dias.” O transtorno mental não tem fisionomia. Esqueçam o clichê da depressão como alguém triste pensando em acabar com a vida. Abandonem a ideia do psicopata como um indivíduo frio e calculista que sempre maltratou os animais. Cada transtorno tem suas expressões e silêncios. Basta parar a correria de dizer “Bom dia! Tudo bem?” e nem esperar a resposta do outro. Você pode evitar uma tragédia anunciada com um simples gesto de atenção.

sábado, 16 de setembro de 2017

“O transporte é público, meu corpo não”


Há cerca de duas semanas uma mulher foi vítima de assédio sexual no ônibus em SP. O agressor, que já foi preso outras quatro vezes por motivo semelhante, foi solto e repetiu o crime em menos de uma semana. No entanto, para o juiz que julgou o caso, “não houve constrangimento.” Se passar vergonha não é algo constrangedor, é o que então?
Todos os dias centenas de mulheres são incomodadas nas ruas com algum comentário machista, um assovio, uma cantada... O fato de andar sozinha já faz os homens sentirem-se mais corajosos para tentar uma aproximação. Caso haja uma retaliação, o agressor justifica-se dizendo que a vestimenta da mulher era provocativa e por isso ela estaria se insinuando. E desde quando SOMENTE a roupa é um convite para algo a mais?     
Essa desculpa, apesar de obsoleta, continua sendo usada para sustentar machismo e o modelo de sociedade patriarcal. Os meninos não devem chorar e devem ser os “chefes” da casa, enquanto as meninas devem ter filhos e não uma profissão. Assim, a ideia de cultura inclinada ao machismo é ensinada, ainda que inconscientemente, desde cedo por meio de brincadeiras infantis e famosos clichês, como: “Comporte-se como uma mocinha” ou “Menino é mais arteiro mesmo.” Em outras palavras, homem pode tudo; mulher nem tudo.
É nessa ideia internalizada de sociedade patriarcal que muitas mulheres suportam o assédio sexual e até mesmo a violência doméstica. A vergonha e o medo da denúncia levam a mulher a justificar o crime dizendo que ela deve ter feito algo para “merecer” esse castigo. Suportar as investidas de um superior no ambiente de trabalho, os assovios ao atravessar a rua...

O transporte é público, meu corpo não” é o que compartilhavam diversas mulheres nas redes sociais. O direito constitucional da liberdade encontra-se ameaçado. Com que tranquilidade se vai de casa ao trabalho se a cada 11 minutos uma mulher é violentada no país? Para que denunciar se o juiz poderá alegar que não houve constrangimento? O sentimento de vergonha é irreparável. E em pleno 2017, ainda precisamos defender nossos direitos de igualdade e liberdade.

sábado, 19 de agosto de 2017

Que país é este?


“Nas favelas, no senado sujeira pra todo lado/Ninguém respeita a Constituição, mas todos acreditam no futuro da nação.” Desde os anos 80 os jovens brasileiros vêm cantando indignados “Que país é este?”, mas parece que ainda não conseguiram responder. Aparentemente o que chega até nós é que divulgar uma ideia é fácil, lutar por ela é que é difícil.
Como podemos aprender a não apenas a gritar, mas a fazer algo, se nossos pais, aquela mesma juventude tão questionadora de outrora, hoje se encontram em trabalhos infelizes para pagar impostos exorbitantes, porque viram que não adianta discutir com “coronel”. Como prosseguir vendo que os brasileiros se cansam e esquecem facilmente da história política do próprio país?
Escrevi no ano passado e, com muito pesar, volto a dizer: o cenário político atual é de caos. Mais investigações em andamento e protestos sarcásticos em forma de memes bem-humorados nas redes sociais. Parece que o brasileiro tem uma resiliência gigante e consegue se adaptar a qualquer adversidade. Mas não exponho isso como uma qualidade. A capacidade de “dar um jeitinho” levou o país ao comodismo.
Aprendemos a não enxergar a desigualdade, a corrupção e a falta de educação. Estamos todos contaminados pela “cegueira branca” de Saramago. Desenvolvemos a princípio uma cegueira seletiva, enxergando apenas o que queremos, o que nos faz bem. Mas o que acontece quando ficamos com os olhos fechados por muito tempo? “O mundo está ao contrário e ninguém reparou.”

O livro “Ensaio sobre a cegueira”, mostra uma epidemia, onde todos perdem a visão, gerando um caos na sociedade. Um tenta ser mais esperto que o outro e cada um luta pela sobrevivência a seu modo. Não há respeito, há pouca cooperação e todos vivem de maneira desumana. Parece que você já ouviu essa história antes, não? Ignorando mais um retrocesso na política do Brasil, seguimos apenas cantando “Que país é este?”

sábado, 15 de julho de 2017

Pais bons são pais desnecessários


Freud já dizia que mãe boa é aquela que vai se tornando desnecessária ao longo da vida. Não, não falo de falta de cuidado, mas de confiança. Pais bons são aqueles que ensinam suas crianças sobre respeito, amor e autoestima. São aqueles que criam seus filhos para que sejam independentes, confiantes e felizes com suas próprias escolhas. Em suma, pais bons são porto seguro.
Aquela mãe superprotetora, por mais bem que pense fazer ao seu filho, acaba o privando de conhecer o mundo – e seus perigos – por si mesmo. Ela evita uma situação desconfortável, facilita a resolução de problemas e prepara a criança para um mundo seguro (perto dela). Ela só esquece que os filhos crescem e ela não viverá para sempre.
Há quem diga que você só sabe se foi uma boa mãe quando os filhos já cresceram. É no momento que o jovem decide seu caminho que os pais podem enxergar se conseguiram ensinar tudo o que julgavam necessário. Ainda que cada família tenha uma maneira de pensar e educar suas crianças, o propósito maior é vê-las felizes. E por acaso sabemos o que é felicidade para o outro?
Entender que cada filho é único a mãe entende, mas compreender que essa singularidade traz consigo uma gama de opiniões e sonhos próprios é mais difícil. As escolhas do outro nem sempre fazem sentido para nós e é preciso um pouco de flexibilidade e muito respeito para aceitar a escolha da pessoa. Aceitar a decisão de um filho é aceitar que ele não é a criança que você idealizou. E mais uma vez, é um grande desafio.
Ele nasce (e não tem os olhos azuis tão sonhados), cresce (decide ser educador físico em vez de médico) e decide sair de casa (e partir para longe dos pais). Precisamos lembrar que nossos sonhos nem sempre são os sonhos dos nossos filhos. Nesses momentos em que o desespero bate, lembre-se da criação. Pais desnecessários são porto seguro e serão sempre “lar” para onde os filhos voltam de tempos em tempos. Acredite nos seus ensinamentos e nunca estará longe das “suas” eternas crianças.

segunda-feira, 19 de junho de 2017

Quando eu fiquei doente de tanto trabalhar


Parece mentira, mas muitas pessoas estão adoecendo devido às constantes exigências cada vez mais complexas do mercado de trabalho. Você precisa se especializar cada vez mais, falar ao menos dois idiomas e conseguir cumprir metas quase irrealistas... tudo para manter o emprego. Acontece que a antiga definição de trabalho, do latim, tripalium, tortura, voltou com toda a força e as pessoas voltaram a adoecer não só física, mas psicologicamente.
A Síndrome de Burnout é uma resposta do organismo a situações de estresse contínuas no ambiente de trabalho. É o famoso estado de esgotamento. A sociedade capitalista demanda um giro de mercado acelerado e a geração de empregos está intimamente ligada à produção. Na tentativa de manter um emprego, as pessoas podem desgastar-se física e mentalmente tentando obter cada vez mais resultados e mostrar maior desempenho.
A carreira é determinante na vida para o sujeito inserido em uma sociedade. O trabalho representa seu papel social e sua função para construção de identidade. O emprego garante seu status social, portanto, mesmo descontente e sofrendo, o sujeito continua trabalhando. Forma-se, então, um círculo vicioso, onde o estresse e as cobranças da organização afetam os profissionais e estes afetam a empresa, tendo dificuldades de trabalhar em seu potencial máximo.
Apesar de ser uma doença relacionada ao trabalho, ela afeta a vida pessoal e os sintomas prejudicam a qualidade de vida como um todo. Esses variam entre dores físicas, como cefaleia, gastrite, mal-estar, e alterações psicológicas, como oscilações de humor, problemas de sono, dificuldade de concentração, entre outros. De modo geral, é um grito de socorro do seu corpo.
O cérebro também precisa de descanso. O cansaço acumulado e o estresse constante alteram conexões cerebrais, fazendo-o sentir os sintomas já listados acima, além de contribuir para o envelhecimento. A síndrome de Burnout é um transtorno psicológico e como qualquer doença, há tratamento. A diferença é que o princípio ativo é o próprio sujeito. A medicação alivia os sintomas, mas somente quem sofre pode mudar a maneira de “se matar de trabalhar”.

sábado, 13 de maio de 2017

A cicatriz da tristeza


A solidão escapa pelas marcas de estilete no corpo. As manchetes do jornal ilustram adolescentes deprimidos e machucados pela falta de empatia. A era do desapego faz vítimas assim como a AIDS em seu surgimento. Ninguém sabe ao certo o que levava a pessoa a contrair o HIV, nem sabiam um possível tratamento. Pois a cultura dos relacionamentos artificiais acaba de fazer tantas vítimas quanto, por meio do suicídio.
As crianças já não brincam na rua, os adolescentes não se reúnem em barzinhos... é tudo por intermédio das redes sociais. Até mesmo o convite ao suicídio foi realizado por meio eletrônico com o convite para o jogo “Baleia Azul”. Jovens são convidados a completar uma lista de 50 desafios, sendo que o último é acabar com a própria vida. É, “O mundo está ao contrário e ninguém reparou.”
Esse jogo surgiu na Rússia e neste ano teve uma repercussão maior devido aos casos ocorridos no Brasil. No entanto, esse jogo é apenas a “ponta do iceberg”. É apenas a brincadeira do momento, assim como foi o jogo da asfixia meses atrás. A juventude está doente e a pressa cotidiana não deixa tempo para percebermos a proporção que a tristeza tomou. O suicídio é coisa séria, mas não somos educados para falar da morte, então deixamos passar mais um tabu.
É preciso falar sobre o suicídio, sobre a depressão, sobre a solidão. A falta de empatia leva à negação do problema alheio e, consequentemente, ao isolamento. Cada um sofre em seu canto, não há espaço para dividir os temores. A geração que vive para o trabalho não consegue se encontrar com a geração que ninguém compreende. Há um gap, um espaço que é preenchido pelo vazio da esperança.

Novamente, a demanda no consultório é de depressão, ansiedade, síndrome do pânico. Mais uma vez, a razão é a falta de tempo para os filhos, a pouca atenção ao sofrimento alheio e a cultura cada vez mais desapegada por fora e sentimentalista por dentro. Chega a ser assustador que a depressão, uma doença mental, seja mais incapacitante do que o câncer. A tristeza constante é algo sério. As consequências podem ser desastrosas e as cicatrizes, permanentes.

sábado, 29 de abril de 2017

Big Brother: a nova caixa de Skinner



Mais uma edição do programa Big Brother no Brasil com muitas polêmicas e uma audiência espetacular. Pessoas sentadas em frente à TV acompanhando os movimentos de cada participante e vivendo as “emoções de novela” representadas pelos participantes. Uma simples pergunta me vem à mente: “Os participantes são os “controlados” ou os controladores?”
O termo “Big Brother” teve origem com George Orwell em seu livro “1984”, que narrava uma sociedade vivendo sob vigilância desse “grande irmão” que tudo vê e controla. Na psicologia, ratos são colocados na caixa de Skinner, uma caixa de vidro, com uma pequena abertura para a água e uma barra, a qual o animal deve pressionar para “ganhar” a água. O rato deve aprender que para ganhar a recompensa, deve agir de uma determinada maneira. Associando o comportamento animal ao humano, os participantes são os ratos, enquanto o público é esse “grande irmão” operando uma caixa de Skinner.
Discussões, relacionamentos, competição, emoção... tudo isso acontece naturalmente. Um grupo de pessoas reunidas apresenta também esses comportamentos pelo simples fato de serem humanos. Relacionar-se faz parte da vida e cada um tem uma opinião diversa sobre os mais variados conceitos. A diferença do Big Brother para a sociedade como um todo, é que além dessas pessoas estarem competindo, elas estão também sendo observadas.
A famosa “espiadinha” dos participantes em um ambiente confinado os leva a reagir de uma determinada maneira para conquistarem a empatia do público e consequentemente, o prêmio em dinheiro. O modo como as pessoas se comportam quando estão sozinhas é diferente de quando estão em uma “vitrine de competição”. Os “ratos” devem aprender a melhor maneira de sobreviverem à competição. A pergunta que sempre me faço é: “Para quê fazem isso?”

Infelizmente, a resposta aparece no consultório. A demanda de muitos pacientes diz respeito à falta de reconhecimento. Ela vem em forma de ansiedade, depressão, isolamento, desmotivação e solidão. A busca pela praticidade e os avanços tecnológicos fazem o tempo “voar” e os relacionamentos tornarem-se mais voláteis. O comportamento aprendido é o desapego. Como consequência, as pessoas começam a sentir falta da companhia, do cara a cara, do elogio. A falta de reconhecimento leva à angústia de viver sem ser notado. É aí que a busca pela atenção se transforma em entretenimento... e mais tristeza.

sábado, 25 de março de 2017

“O afeto é revolucionário”



Apenas sete meses de vida e uma história tão longa para contar. Um diagnóstico, as complicações de saúde, mas finalmente a esperança de recuperação. A difícil realidade de quem precisa acreditar nos outros para sobreviver. No entanto, como sensibilizar as pessoas que foram educadas a não deixar transparecer seus sentimentos em plena era de relacionamentos digitais?
O filme “Ensaio sobre a Cegueira”, baseado no livro homônimo de José Saramago, mostra como as pessoas passam a se comportar (e a serem tratadas) após uma epidemia de “cegueira branca” atingir a cidade. A perda da visão é usada como metáfora para o fato de não querermos enxergar os outros, focando-nos cada dia mais em nossos problemas e minimizando o sofrimento alheio.
A era racional e prática raramente dá margem à sensibilidade. A constante exposição à violência, à falta de respeito e às mortes leva a um sentimento de frieza. O sentimento de culpa, que a princípio temos pelas injustiças sociais, se transforma em frieza para que nosso consciente não sofra com essa punição inconsciente de que “eu poderia fazer algo para mudar isso.” No entanto, muitas vezes o incômodo prevalece e é aí que reside a empatia.
Empatia é a capacidade de se colocar no lugar do outro. É só assim que podemos compreender a dor do outro, um sofrimento que não temos ideia de como é, mas que conseguimos imaginar pelo simples fato de estarmos dispostos a compreender. É somente com empatia que entendemos que dores não são comparáveis; minha angústia não é maior nem menor que a do outro, ela é diferente, pois cada um sente de uma maneira com uma intensidade diferente.

Foi com essa sensibilidade ainda presente no ser humano que Joaquim, diagnosticado com atrofia muscular espinhal (AME) tipo 1, despertou a empatia de milhares de pessoas, que se mobilizaram e fizeram doações com esperança na recuperação da criança. Em tempos de crise financeira e emocional, a cabeça parece que vai explodir... ainda bem que é o coração quem insiste e resiste talvez para mostrar que o afeto é sim revolucionário.

sábado, 18 de fevereiro de 2017

A boca cala, o corpo fala


Você já teve dor de cabeça “de preocupação”? Ou ficou com dor de estômago após passar raiva? Se já sentiu incômodo físico, sem qualquer razão aparente, você teve um quadro psicossomático, ou seja, transferiu algo emocional para o corpo, afinal, quando a boca cala, o corpo fala.
O ser humano funciona de maneira integrada (lembra daquele famoso ditado “mente sã, corpo são”), assim como a homeostase corporal, precisamos manter também nosso equilíbrio psíquico. Somos feitos de carne, osso e alma; da mesma maneira que “somos o que comemos”, somos o que sentimos e o que pensamos. Há diversas teorias que sugerem o poder dos nossos pensamentos em alterar nosso estado físico, de modo que somatizamos um sintoma psíquico em maior ou menor grau dependendo de nossos recursos.
Há diversas discussões sobre as causas da fibromialgia, da gastrite, de alergias, dentre outras condições, sendo que muitos estudos afirmam ser o estado mental que interfere nessa alteração corporal. Há de se lembrar que muitas doenças têm origem puramente orgânica; uma gastrite pode ser causada por uma má alimentação e uma alergia pode se dar pelo contato com algum alérgeno. Ainda assim, considera-se que pode haver conteúdos inconscientes na nossa mente que tornam nosso organismo mais vulnerável ao desenvolvimento de algumas doenças.
Mas se nós mesmos produzimos nossos problemas, por que não podemos resolvê-los? A resposta é muito simples: porque não temos consciência da nossa condição e principalmente da nossa psique. Quando surge qualquer sintoma físico, procuramos todas as possíveis causas orgânicas, que sempre deve ser o primeiro passo. Quando nada é encontrado, devemos procurar por razões psíquicas que possam ter desencadeado esses sintomas, considerando que cada individuo vivencia suas questões de maneira única e por vezes, pode não ter notado que sua enxaqueca é gerada pelo estresse em seu ambiente de trabalho, por exemplo.

Dessa maneira, fatores genéticos, psicológicos e ambientais devem ser considerados ao analisar a causa de uma patologia. Ao contrário da nossa pressa cotidiana, onde problemas devem ser resolvidos o mais rapidamente possível (geralmente com uso de medicação), apenas combater o sintoma não necessariamente eliminará a condição em si; é preciso buscar a origem para que essa causa possa ser trabalhada e finalmente solucionada. Fundamental é ter consciência de seu corpo e sua mente como integração do seu “eu”.

sábado, 14 de janeiro de 2017

Janeiro branco


No texto anterior falei sobre as famosas promessas de ano novo, que vêm com um “espírito” de mudança de vida. Essa esperança de melhoria depende de cada um e vem ao encontro da campanha “Janeiro branco”, que busca uma maior reflexão acerca do papel ativo de cada ser humano na construção da sua própria história, conceito intimamente relacionado a uma boa saúde mental.
O projeto lançado em 2014 tornou-se lei em 2017 no município de Uberlândia, MG, onde a ideia foi apresentada pelo psicólogo Leonardo Abrahão. A intenção é gerar uma maior conscientização a respeito da saúde mental e sua importância na vida das pessoas. Assim como a saúde física é essencial, a mental segue o mesmo raciocínio, afinal “mente sã, corpo são”.
Um dos objetivos dessa campanha é mostrar que o ditado “ano novo, vida nova” é possível, já que se a pessoa quer mudar, ela consegue. Tem a ver com força de vontade, determinação e foco. Seja emagrecer, passar em um concurso ou juntar dinheiro para viajar... tudo depende do esforço que a pessoa está disposta a fazer, o que será possível se ela compreender que ela pode.
Uma boa saúde mental e emocional depende ainda dos círculos sociais, sempre lembrando que o ser humano é um ser social. Uma rede de apoio com familiares e amigos faz muita diferença na intensidade de foco que o indivíduo coloca em seus objetivos, afinal já foi dito que filhos que têm o apoio dos pais são mais felizes e possuem a autoestima mais elevada.

Com a segurança de que você pode, você segue em frente apesar dos obstáculos. Assim como o corpo, a mente também necessita de cuidados, e como já disseram “a boca fala aquilo do que o coração está cheio”. É por isso que o “Janeiro branco” passa a ser um marco na saúde mental, reafirmando agora na prática que uma mente sã, confiante e convicta é sinônimo de bem-estar e sucesso pessoal e profissional.